A enxaqueca faz parte da vida de pelo menos 1 bilhão de pessoas em todo o mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), com impactos que seguem para além dos sintomas dolorosos, sendo classificada como a sexta doença mais incapacitante do mundo¹.
Só no Brasil, a enxaqueca atinge cerca de 15% da população, o que equivale dizermos que quase 30 milhões de pessoas² apresentam quadros limitantes. Para se ter uma dimensão de sua repercussão, pacientes com cefaleia representam 4,5% dos atendimentos em unidades de emergência, sendo o quarto motivo mais frequente de consulta nas nessas unidades³.
Mesmo assim, há quem acredite que a enxaqueca seja frescura, e para esclarecer sua relevância não apenas para quem convive diretamente com a doença, como quem lida com as pessoas que sofrem do problema, conversamos com o neurologista Dr. Alexandre Kaup (CRM-SP85998).
Na opinião do doutor, por que muita gente não leva a enxaqueca a sério?
O principal motivo é o desconhecimento. A dor não é algo palpável, principalmente a dor do outro. As pessoas conseguem entender mais facilmente uma doença quando enxergam algo físico, e a enxaqueca não tem isso. E tem também uma questão cultural que volta e meia banaliza o sintoma de dor de cabeça o relacionando com falsa justificativa para faltas a compromissos.
O fato de a enxaqueca não ser levada a sério mesmo por quem sofre do problema costuma atrasar a procura de ajuda médica e levar a automedicação. Quais as consequências deste mau hábito?
Quando o paciente resolve se medicar por conta própria ele se submete a riscos importantes. No caso da enxaqueca crônica, o uso de medicamentos constantes e sem indicação médica pode gerar diversas consequências ruins, sendo a primeira delas a piora da dor devido ao efeito rebote do excesso e abstinência da medicação, fazendo com que a quantidade de medicamentos para suprir a dor seja cada vez maior. Além disso, alguns medicamentos como, por exemplo, os anti-inflamatórios, quando usados em excesso, podem levar a aumento da pressão arterial, problemas renais, dores de estômago, sangramentos, gastrite, entre outros.
É correto tomar analgésico sempre que está com dor?
Existe um limite para uso de medicamentos para dor em períodos que devem ser bem determinados. E existem também tipos específicos de medicações que devem ser usados para a prevenção da dor, que são diferentes dos indicados para controle das crises.
Como é feito o diagnóstico da enxaqueca crônica?
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O diagnóstico é clínico, ou seja, feito a partir de contextualização do histórico de crises e hábitos de vida do paciente junto ao médico. Exames de imagem só são realizados para descartar suspeitas de outras doenças que podem estar gerando a dor de cabeça. A enxaqueca é reconhecida como uma dor de cabeça forte, de nota 7 para cima numa escala de 1-10, que pode pegar um lado da cabeça e mudar de lado em crises diferentes, dor latejante ou pulsátil. Durante a crise a pessoa sente mais incomodado com a luz, barulho, podem ter náuseas e vômitos e piorar com atividade física rotineira. Além disso, a dor pode durar de 4 a 72 horas se não tratada ou se for tratada de maneira inadequada. Ela pode se dar de forma episódica ou crônica.
Como a enxaqueca crônica impacta no dia a dia de quem sofre com a doença?
A incapacidade gerada pela dor vai depender de alguns fatores: alguns pacientes têm mais náuseas e vômitos associados à crise. Alguns apresentam a enxaqueca com aura caracterizada por alterações visuais, sensibilidade (com formigamentos) nos membros, e/ou dificuldade na fala, que podem durar até uma hora e impedem a pessoa de “funcionar” normalmente. Além disso, pessoas com crises frequentes, mais de cinco dias de dor ao mês, têm mais chances de apresentar sintomas de ansiedade, depressão e má qualidade do sono.
Qual a importância de fazer o tratamento médico?
Em primeiro lugar é receber o diagnóstico correto, já que existem diversos tipos de dor de cabeça e alguns com causas possíveis de serem definidas, outras não. Em alguns casos as dores de cabeça frequentes podem significar um problema de saúde mais grave e apenas o especialista, no caso o neurologista, poderá identificar o tipo e a forma como se apresenta naquele paciente e realizar o planejamento do tratamento que melhor se encaixa ao seu caso.
Tratamento da enxaqueca crônica
O tratamento da enxaqueca crônica envolve fatores multidisciplinares que podem depender de mais de um profissional envolvido. Em relação às medicações, é preciso considerar o que já é consenso nas sociedades médicas, e que também relaciona hábitos vida que possam estar impactando na evolução das crises, como alimentação, atividade física, rotina, entre outros.
¹Classificação interna de cefaleias – 3a edição -2014
²Queiroz LP, Peres MF, Piovesan EJ, Kowacs F, Ciciarelli MC, Souza JA, Zukerman E. A nationwide population-based study of migraine in Brazil. Cephalalgia. 2009
Jun;29(6):642-9.
3 Friedman BW, Lipton RB. Headache emergencies: diagnosis and management. Neurol Clin 2012; 30: 43-59.